Desmonte do sistema de controle Sicobe e avanço de redes ilegais impulsionam mercado clandestino de álcool no país. Casos de intoxicação em São Paulo acendem alerta nacional.
Um levantamento da Euromonitor International, divulgado neste mês, revela um dado alarmante: mais de 30% dos destilados comercializados no Brasil são falsificados. A pesquisa, intitulada “Mercado Ilegal de Álcool no Brasil”, indica que 29,7% das bebidas destiladas disponíveis no país têm origem ilegal — seja por falsificação, refil de garrafas originais ou produção sem registro oficial.
O problema, segundo o estudo, se agravou após a desativação do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe), em 2016. Criado pela Receita Federal, o Sicobe registrava automaticamente cada unidade produzida pelas indústrias e permitia rastrear o volume real de bebidas fabricadas. Desde a sua extinção, o controle passou a depender da autodeclaração das empresas, o que abriu espaço para o avanço das fraudes e o fortalecimento do crime organizado no setor.
“Sem o Sicobe, a rastreabilidade da produção foi praticamente perdida. O mercado ilegal encontrou um ambiente fértil para crescer”, afirmou um especialista ouvido pelo relatório.
Crimes e riscos à saúde
O impacto da falsificação vai além das perdas econômicas — ele ameaça diretamente a saúde pública. Nesta segunda-feira (29), o comitê técnico do Ministério da Justiça reuniu-se com representantes da área da saúde para discutir o aumento de casos de intoxicação por bebidas adulteradas em São Paulo.
A Prefeitura de São Bernardo do Campo confirmou a terceira morte suspeita ligada ao consumo de bebidas contaminadas com metanol, substância altamente tóxica e proibida na fabricação de bebidas alcoólicas. Outros dez casos seguem em análise pela Secretaria de Estado da Saúde.
Autoridades apontam que o metanol é usado por falsificadores como substituto do etanol, reduzindo custos, mas provocando graves intoxicações, cegueira e até a morte. Em 2022, episódios semelhantes já haviam sido registrados em estados como Paraná, Goiás e Pernambuco.
Prejuízos bilionários e falta de controle
Além do risco à saúde, o mercado ilegal causa um rombo estimado em bilhões de reais em arrecadação de impostos. A Euromonitor estima que a evasão fiscal relacionada à produção e comercialização de bebidas falsificadas ultrapasse R$ 10 bilhões anuais.
Especialistas defendem que o governo reative um sistema de controle semelhante ao Sicobe e fortaleça a fiscalização nas fronteiras e canais de distribuição. “Enquanto não houver rastreabilidade eficiente e punições exemplares, o crime organizado continuará lucrando”, avalia o economista e consultor em políticas públicas, Paulo Andrade.
Reação do governo
Em nota, o Ministério da Justiça afirmou que estuda novas medidas de controle e rastreabilidade, em parceria com a Receita Federal e o Ministério da Agricultura. O governo também promete intensificar operações conjuntas com as polícias civil e federal para combater laboratórios clandestinos.
Enquanto isso, especialistas alertam: consumidores devem redobrar a atenção. É recomendável verificar selos fiscais, procedência e integridade das embalagens antes da compra. “Se o preço for muito abaixo do mercado, desconfie. Pode custar a vida”, reforça a Secretaria da Saúde de São Paulo.




